Doutrina Social da Igreja

on segunda-feira, 11 de março de 2013

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ - PUCPR
Temas de práxis pastoral – Doutrina Social da Igreja
Aluno: Luiz Fernando de Lima
Curso: Mestrado em Teologia
Professor: Agenor Brighenti
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CENTESIMUS ANNUS, um século de Doutrina Social da Igreja

Em 1891, o mundo conheceu a Rerum Novarum, a primeira carta encíclica da Igreja que versava sobre questões sociais. Este documento pontifício iniciou a produção de um rico e extenso arcabouço de conhecimento e orientações a partir da doutrina da Igreja, permitindo ao Evangelho social tomar vida também nos documentos do magistério eclesiástico.
Cem anos após este acontecimento, o Papa João Paulo II, que havia escrito a Laboren Exercens e a Sollicitudo Rei Socialis, fez conhecer o seu terceiro documento de cunho social que, justamente, chamou de Centesimus Annus. Esta encíclica é datada de 01 de maio de 1991 e tem como principal objetivo fazer um levantamento de todo um século de produção da doutrina social da Igreja e também, analisar a queda do muro de Berlim acontecida em 1989, que mais do que um simples muro caído significou a queda de toda uma forma de governo, o socialismo.
A CA está dividida em seis capítulos. Na introdução e no primeiro capítulo, João Paulo II apresenta uma análise da RN, seu contexto e a intervenção da Igreja, mostrando os traços característicos da RN e a denominando de “imortal documento”. Também aqui aparece claramente que a Igreja “não pretende emitir juízos definitivos” sobre as questões que serão exploradas (nn. 1-3). Após analisar as “coisas novas” de ontem, as “coisas novas” de hoje são apresentadas no segundo capítulo. Os acontecimentos de 1989 é o tema do terceiro capítulo e, nos demais quarto – quinto – sexto capítulos, se fala da propriedade privada e o destino universal dos bens, do Estado e cultura e do homem como caminho da Igreja, respectivamente.
Alguns princípios da RN aparecem elencados na CA que os retoma e amplia. São eles: dignidade do trabalho e direito à propriedade privada (nn. 6); direito de associação e direito a condições dignas de trabalho (nn. 7); direito a um salário justo (nn. 8) e a cumprir os deveres religiosos (nn. 9); a atenção  aos pobres e o bem comum (nn. 11).
Para João Paulo II, “cem anos depois da publicação da Rerum Novarum, a Igreja encontra-se ainda diante de ‘coisas novas’ e de novos desafios” (nn. 61). A releitura da RN serve para lançar o olhar para o futuro e assim, difundir luz sobre a humanidade.
Alguns temas merecem destaque especial: trabalho digno (nn. 7); justo salário (nn. 8); direito de cumprir livremente os deveres religiosos (nn. 9); a opção pelos pobres (nn. 11); a concepção cristã de pessoa (nn. 13); a subsidiariedade (nn. 15); a verdadeira paz (nn. 18); a corrida armamentista (nn. 18 e 28); a sociedade do bem-estar ou do consumo (nn. 19 e 36); novas formas de democracia (nn. 22); o verdadeiro progresso humano integral (nn. 29); propriedade privada (nn. 30); destino universal dos bens (nn. 31); a semiescravidão  e as gritantes desigualdades no terceiro mundo (nn. 33); a dívida externa de muitos países (nn. 35); a questão ecológica (nn. 37); a centralidade do homem dentro da sociedade (nn. 54), etc.
Diante de toda esta riquíssima temática, vale destacar a voz da CA a respeito, sobretudo, do consumismo, que se coloca como corolário do individualismo, da fragmentação e da subjetivação que passa a sociedade. Para a CA, o uso desenfreado da droga e o próspero mercado da pornografia são consequências do uso irresponsável do poder de escolha dos cidadãos (nn. 36). É preciso também tomar cuidado com uma possível “’idolatria do mercado’, que ignora a existência de bens que, pela sua natureza, não são nem podem ser simples mercadoria” (nn. 40). A CA, perante a situação de uma aparente vitória do capitalismo sobre o socialismo, deixa claro que “a Igreja não tem modelos a propor” (nn. 43), mas que encara com simpatia o sistema da democracia, todavia, chama a atenção já que “uma autêntica democracia só é possível num Estado de direito e sobre a base de uma reta concepção da pessoa humana” (nn. 46). No nn. 26, João Paulo II reconhece que “a crise do marxismo não elimina as situações de injustiça e de opressão no mundo”. Por fim, merece ainda destaque o conceito de paz trazido pela CA: “a verdadeira paz – deve-se lembrar – nunca é o resultado da vitória militar, mas implica a superação das causas da guerra e a autêntica reconciliação entre os povos” (nn. 18).
Para os dias de hoje, os ensinamentos e as indicações da CA continuavam válidos e pertinentes. Basta lembrar que a “questão ecológica” tem a cada dia assumido proporções maiores, mostrando que o homem ainda não entendeu que alguns recursos naturais não são renováveis. A respeito do consumismo, que a CA propugnava uma verdadeira liberdade na hora da escolha, hoje é mais do que evidente que para “existir” necessariamente tem-se que consumir; parafraseando Descartes pode-se dizer: “consumo, logo existo”. Também sobre a opção preferencial pelos pobres, que a CA diz ser a elevação deles uma “grande ocasião para o crescimento moral, cultural e até econômico da humanidade inteira” (nn. 28), nota-se que ainda se está na opção, sem nada fazer de concreto.
Por conseguinte, a CA procura comemorar não só os cem anos da Rerum Novarum, mas um século de doutrina social da Igreja bem como analisar os acontecimentos de 1989 e o seu impacto na sociedade em geral. A CA tem como grande legado talvez o entendimento de que “para a Igreja, a mensagem social do Evangelho não deve ser considerada uma teoria, mas sobretudo um fundamento e uma motivação para a ação” (nn. 57).

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